quarta-feira, 26 de setembro de 2012

O ILUMINISMO

Na Idade Moderna, a História passou por grandes movimentos Intelectuais, Econômicos, Políticos e Sociais, baseadas nos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade.

hoje vamos explicar um pouco sobre o Iluminismo.
 
O Iluminismo foi um movimento intelectual que surgiu durante o século XVIII na Europa, que defendia o uso da razão (luz) contra o antigo regime (trevas) e pregava maior liberdade econômica e política.
 
Origens - no final do século XVII, na Inglatera com John Locke no contexto da Revolução Gloriosa de 1688, justificando-a pela razão. Locke é considerado o pai do Iluminismo.
Definição de Iluminismo – trata-se de uma filosofia de origem burguesa, de caráter revolucionário e racionalista (busca esclarecer por meio do saber). A razão é a luz que conduz o homem à verdade do conhecimento. Caracteriza-se pela materialização dos fenômenos e pelo Empirismo (a observação permite a elaboração de uma teoria científica).
Principais Concepções ou Características do Iluminismo
* Racionalismo – ênfase na razão esclarecida pelas Luzes do Conhecimento.
* Naturalismo – crença na perfeição da natureza.
* Liberalismo – reconhecimento da liberdade como direito natural do homem. Essa liberdade seria nos níveis econômico, político e intelectual, o que levou os iluministas a condenar o Absolutismo, o Intervencionismo e a intolerância. Prém a liberdade deveria ser limitada pelos valores morais e respeito aos demais.
* Igualdade perante a lei – a lei não poderia privilegiar alguém com base em seu nascimento ou condição social.
* Anticlericalismo – muitos pensadores e filósofos do período eram teístas, acreditavam em um Deus criador, mas eram contra a Igreja (especialmente a Católica), pois esta apoiava o absolutismo e também se colocava acima da razão.
O Iluminismo tinha o apoio da burguesia, pois os pensadores e os burgueses tinham interesses comuns.

As críticas do movimento ao Antigo Regime eram em vários aspectos como:
- Mercantilismo.
-Absolutismo monárquico.
- Poder da igreja e as verdades reveladas pela fé.
Com base nos três pontos acima, podemos afirmar que o Iluminismo defendia:
- A liberdade econômica, ou seja, sem a intervenção do estado na economia.
- O Antropocentrismo, ou seja, o avanço da ciência e da razão.
- O predomínio da burguesia e seus ideais.

As idéias liberais do Iluminismo se disseminaram rapidamente pela população. Alguns reis absolutistas, com medo de perder o governo - ou mesmo a cabeça -, passaram a aceitar algumas idéias iluministas.
Estes reis eram denominados Déspotas Esclarecidos, pois tentavam conciliar o jeito de governar absolutista com as idéias de progresso iluministas.
Alguns representantes do despotismo esclarecido foram: Frederico II, da Prússia; Catarina II, da Rússia; e Marquês de Pombal, de Portugal.
 
Alguns pensadores ficaram famosos e tiveram destaque por suas obras e idéias neste período. São eles:

John Locke é Considerado o “pai do Iluminismo”. 
Defendia a idéia de que o conhecimento da realidade aconteceria basicamente através da experiência. Assim, defendia a tese de que o cérebro humano era uma tábula rasa, na qual as idéias provenientes da experiência sensível que ele possui com a realidade, eram marcadas. Na política, Locke foi um crítico do absolutismo e defensor da liberdade plena do cidadão, incluindo aí o direito a propriedade privada.
Sua principal obra foi “Ensaio sobre o entendimento humano”, aonde Locke defende a razão afirmando que a nossa mente é como uma tábula rasa sem nenhuma idéia. Defendeu a liberdade dos cidadãos e Condenou o absolutismo.

Voltaire
François Marie Arouet Voltaire destacou-se pelas críticas feitas ao clero católico, à inflexibilidade religiosa e à prepotência dos poderosos.baseadas nos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade.
Um dos principais teóricos iluministas, Voltaire foi o inspirador de uma nova forma política da Europa do século XVIII: o despotismo esclarecido. Conhecido pela célebre frase: “posso não concordar com nada do que dizes, mas defenderei até o fim o direito que tens de dize-las”, Voltaire foi um ardoroso defensor das liberdades individuais. Criticava veementemente a forma tirânica como se comportavam os monarcas da época.
Apesar de ser contrário ao absolutismo, Voltaire era favorável à monarquia, desde que os monarcas defendessem realmente os interesses e direitos da burguesia. Censurava os gastos excessivos, o luxo e os privilégios da nobreza, criticando ironicamente as instituições absolutistas.
Suas propostas iam ao encontro dos interesses burgueses que almejavam reformas sociais, mas sem um caos político. Ao mesmo tempo, criticava completamente os membros das camadas mais pobres da sociedade, afirmando que os pobres eram merecedores do sofrimento devido à sua ignorância.


Montesquieu
Charles de Secondat Montesquieu em sua obra “O espírito das leis” defendeu a tripartição de poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário. Segundo ele, cada um dos poderes deveria agir de forma a limitar a força do outro, evitando assim, a concentração de poderes nas mãos de uma única esfera. Suas idéias significaram na prática a restrição dos poderes do rei, e não exatamente o fim do poder do monarca. O poder real seria mantido, mas limitado, e não caberia mais a ele a elaboração das leis e o controle da justiça.
No entanto, Montesquieu não era a favor de um governo burguês. Sua simpatia política inclinava-se para uma monarquia moderada.
Rousseau
Jean Jacques Rousseau foi o pensador iluminista que trouxe à tona a representação do pensamento das camadas populares da época. Era defensor da república e afirmava que a fonte do poder derivava realmente do povo. Na sua obra Da origem da desigualdade entre os homens, afirmava: “aquele que concebeu a idéia de cercar uma parcela de terra e de dizer isto é meu, e que encontrou gente suficientemente ingênua que lhe desse crédito, este foi o autêntico fundador da sociedade civil. De quantos delitos, guerras, assassínios, desgraças e horrores teria livrado o gênero humano, aquele que, arrancando as estacas e enchendo os sulcos divisórios, gritasse: cuidado, não daí crédito a esse trapaceiro, perecereis se esqueceres que a terra pertences todos”.
Assim como Hobbes, Rousseau admite a existência do Estado de Natureza, mas afirma que neste, o homem vivia em harmonia, pois não existia a desigualdade social. A quebra da harmonia do estado de natureza, segundo Rousseau aconteceria devido à instituição da propriedade privada.
A teoria de Rousseau não admite a representação da vontade de um cidadão por outro. Para ele, a participação popular tem que ser direta e na sociedade deve haver a participação de todos os cidadãos. As idéias de Rousseau encontraram grande aceitação entre os revolucionários de 1789 na França, mas atendia apenas aos interesses de alguns grupos da burguesia ligados às alas mais radicais.
Assim, Rousseau despontava como crítico dos interesses da burguesia e defensor das causas mais ligadas às camadas populares.
Rousseau é autor da obra “O contrato social”, na qual afirma que o soberano deveria dirigir o Estado conforme a vontade do povo. Apenas um Estado com bases democráticas teria condições de oferecer igualdade jurídica a todos os cidadãos.
Rousseau destacou-se também como defensor da pequena burguesia.
Foi portanto partidário da democracia. Afirmava que o Estado era o representante da vontade geral, com um ordem estabelecida por um Contrato Social.

Quesnay
François Quesnay foi o representante oficial da fisiocracia. Os fisiocratas pregavam um capitalismo agrário sem a interferência do Estado.

Adam Smith
Adam Smith foi o principal representante de um conjunto de idéias denominado liberalismo econômico, o qual é composto pelo seguinte:
- o Estado é legitimamente poderoso se for rico;
- para enriquecer, o Estado necessita expandir as atividades econômicas capitalistas;
- para expandir as atividades capitalistas, o Estado deve dar liberdade econômica e política para os grupos particulares.
A principal obra de Smith foi “A riqueza das nações”, na qual ele defende que a economia deveria ser conduzida pelo livre jogo da oferta e da procura.
 
Diderot e d’ Alembert elaboraram a Enciclopédia;
 

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

QUILOMBO DE BROTAS EM ITATIBA - RIQUEZA CULTURAL AMEAÇADA


A história do quilombo impressiona afinal Brotas já era um quilombo antes mesmo da fundação de Itatiba. Cabe inclusive a defesa da hipótese de que foram os quilombolas que fundaram a cidade. Observei que  o crescimento urbano desordenado vem criando problemas para a comunidade, onde vivem hoje  aproximadamente 32 famílias. Recentemente, a construção de um loteamento assoreou o córrego que corta o sítio Brotas.

O impacto não foi só ambiental, mas também cultural: as matas e cursos d´água têm grande importância nos rituais de umbanda, religião praticada por vários moradores do quilombo. Existe uma proposta do Itesp  de que seja titulado não só o território que já pertence por direito de herança aos quilombolas, mas também a área de nascente do córrego.

Esse crescimento também fez com que o perímetro urbano englobasse o território do quilombo. Pode-se dizer então que a comunidade é considerada o primeiro quilombo urbano oficialmente reconhecido no Brasil.


Por ser uma área particular, a titulação dependeu Governo Federal, por meio do Incra. Os trabalhos de reconhecimento e titulação foram portanto, acompanhados pelo Ministério Público Federal. A comunidade também contou com o apoio da organização não-governamental Fórum Pró-Cidadania, de Itatiba


É fundamental, nestas considerações, pontuar algumas características da comunidade que vive no Quilombo Brotas. Uma de suas mais destacadas peculiaridades é possuir uma história oral viva e preservada. É essa história oral que ajuda a constituir uma identidade da comunidade.

Trata-se de uma comunidade tradicional, que tem a necessidade de reivindicar políticas públicas que favoreçam seus moradores nas questões de habitação, moradia, transporte, trabalho, produção de renda.

Nota-se que os moradores conseguem perceber, ao longo desses anos, as necessidades que a comunidade possui, porém demonstram dificuldade em se articular politicamente para reivindicar essas necessidades.

Portanto, por meio do Ponto de Cultura, abrem-se possibilidades para que a comunidade se engaje na reivindicação de novas políticas públicas, já que o Ponto de Cultura constitui uma rede de relações que anteriormente era realizada pela memória dos mais velhos que, com o passar dos anos, perdeu sua força.

De fato, o Ponto de Cultura é uma política pública conquistada que colocou os moradores do Quilombo Brotas em contato com amplas possibilidades. Ele tem permitido uma expansão da comunidade que antes era construída pela oralidade e hoje é realizada também pelas relações sociais. Isso ocorre pelo contato com outras comunidades quilombolas, que possuem novas ideias e núcleos culturais. Ter contato com ações empreendidas por essas comunidades proporciona a eles novas perspectivas. É no contato com o outro que a comunidade reconhece seus valores e agrega possibilidades para o futuro.

Quando uma sociedade tradicional se abre para o novo, nascem vastas possibilidades, e ela acaba sofrendo impactos com essa inserção da modernidade. Na comunidade Brotas não foi diferente. A articulação com outras comunidades aumentou. Hoje, seus líderes sociais estão mais articulados, críticos e politizados. Nos discursos, é perceptível essa maior imponência ante aos problemas do Quilombo Brotas. Esta é apenas uma das diferenças visivelmente percebida na comunidade com a interferência do Ponto de Cultura.

A relação entre jovens e velhos com a inserção dessa política pública tem a possibilidade de se tornar mais próxima, principalmente com as oficinas de memória e oralidade, que são alguns dos projetos que estão sendo realizados. Com as visitas de grupos, a história da comunidade é contada e recontada várias vezes. Isso faz com que eles memorizem não só esta, mas muitas outras histórias. No diálogo com o jovem Marcos, essa característica ficou muito presente no momento em que ela reconta a história e diz ter orgulho.

Os conflitos ainda permanecem, mas os membros da comunidade hoje possuem muito mais motivos para se articularem. As oficinas de artesanato têm unido as mulheres do quilombo. As apresentações de dança estão fazendo os jovens se aproximarem mais do que é realizado no quilombo. As festas têm trazido pessoas de diferentes lugares para conhecer a comunidade, e as visitações fazem os moradores se organizarem e se estruturarem para mostrar a própria história e a cultura. A confecção de camisetas tem feito que as pessoas de fora da comunidade deem o valor que eles mesmos ainda não enxergaram.

É fato, portanto, concluir que, com a implantação do Ponto de Cultura “Nas Trilhas do Quilombo Brotas”, em 2010, na comunidade Brotas, essa política pública voltada para as questões culturais está fazendo que nem todos os moradores do quilombo, mas boa parte deles, tenham uma postura diferente diante das questões conflitantes da comunidade.

Dessa forma, é possível sim que uma comunidade, por meio da fomentação da cultura popular, incentivada por uma política pública governamental, possa encontrar caminhos possíveis e viáveis para se autoafirmar como uma comunidade quilombola, orgulhosa de sua história e ancestralidade. E que, por meio das ações realizadas e da valorização da memória oral, se una e construa uma identidade que fixe como característica marcante e permita a seus autores se apoderar da própria cultura e história e ganhar força de articulação por meio da raiz ancestral para reivindicar possibilidades e direito para toda a comunidade.

Isso só é concebível porque a cultura permeia todas as ações da sociedade. Com este artigo, pode-se compreender que a cultura pode ser, portanto, comportamento, e no Quilombo Brotas, tornou-se postura perante o mundo. Como encarar as questões do dia a dia faz parte da cultura de se portar diante de desrespeitos, preconceito, humilhação. Assim como a luta individual, coletiva, a resistência, o trato com as pessoas.

Compreende-se, então, que somente por meio da cultura é que a comunidade quilombola Brotas pode se apropriar de sua memória e dar a devida importância a seu papel fundamental na sociedade itatibense.

É importante reconhecer o esforço da comunidade em criar amplas possibilidades. Para o futuro, é possível que a comunidade continue avançando para conquistar suas necessidades, que possa por meio da valorização da história e da cultura se tornar, cada vez mais, forte para enfrentar as dificuldades vindouras. O momento é de focar na valorização cultural para as crianças, para que elas cresçam possuam orgulho de serem quilombola e possam, assim, levar adiante a tradição do Quilombo Brotas de viver durante anos compartilhando do mesmo território, conflitos e histórias.


Reflexões quanto a visita ao Quilombo de Brotas em Itatiba

Quando pensamos em uma escola a primeira imagem que nos vem à cabeça são nossas prévias experiências da infância e adolescência relacionadas a esta instituição. Quando entramos no curso de pedagogia, disciplina após disciplina desnudamos esta construção histórica e social que é a escola. Nos parece as vezes um tanto quanto óbvio que um currículo deve ser multidisciplinar entretanto, quando voltamos nossos olhos para o currículo real longe das costumeiras prescrições dos discursos pedagógicos presentes nas redações dos currículos sofremos um choque entre o “desejar ser” e aquilo que de fato é.

A instituição escolar possui sua própria cultura. Cultura esta que não se desliga em nada da sociedade em que está inserida e que também a reflete. Espera-se sempre um modelo de professor, um modelo de aluno, aqueles que se adaptam a essa estrutura pré-moldada são considerados bons, aqueles que não se adaptam representam um problema a ser resolvido para que se encaixem no modelo almejado, mas quem, afinal define tais modelos? A própria sociedade. Mas não a sociedade como um todo e sim aquela que parcela detentora do poder. Desta forma criamos uma série de relações humanas baseadas em estereótipos que, independente de sua origem deve-se almejar para que o sucesso seja obtido, são assim criados vários modelos e de certa modo não veladamente o indivíduo é doutrinado a escolher um destes modelos de sucesso para seguir para garantir seu espaço.

O que significa ser uma minoria? Para alguns autores significa não estar no topo das relações de poder mesmo que numericamente a minoria seja superior ao padrão social vigente. Quando relacionamos isso ao Quilombo de Brotas: geração após geração mulheres de ascendência africana lutaram para que tivessem mantidos seus direitos básicos de subsistência e sua terra.


O interesse em ostentar o título de “Quilombo” somente se fortificou quando houve a ameaça de se perder o básico: a terra. Essa ameaça adveio de interesses imobiliários na região onde o quilombo está inserido entre outros problemas como o pagamento de impostos, o direito ao acesso a saneamento básico, energia elétrica, água. A tradição de luta das mulheres deste quilombo é admirável, entretanto, nunca se afastou desta luta pelo mínimo. A pergunta que deve ser formulada é: por quê? Por quê apesar desta força nunca conseguiram se afastar da condição de subsistência?


Ao conversar com a liderança feminina do Quilombo de Brotas  a sra Ana Teresa Barbosa, bisneta de Emília, fundadora do quilombo - foi marcante o ênfase dado ao preconceito relacionado à “cor” negra e a condição econômica desfavorável. No texto de Sacristán sobre a diversidade cultural esta nuance do preconceito nas relações culturais foram apresentadas com detalhamento ímpar e nos convida a refletir a respeito do principio de igualdade proposto pela instituição escolar e como direta ou indiretamente essa mentalidade dominante afeta a vida daquela comunidade.


Há um longo caminho a ser percorrido para trabalharmos conceitos e visões de mundo que são sentidos dentro da escola e como esta lida com as diferenças. Uma vez que as crianças do quilombo são tratadas de modo “igual” ignora-se a ausência do capital cultural valorizado pela sociedade em detrimento as tradições e cultura dos quilombolas. Seria necessário um tratamento diferenciado (como esforço escolar) ao menos no tocante ao conteúdos e não serem tratadas de modo a se enquadrarem na visão etnocêntrica e normatizadora das instituições para que pudessem realmente ter condições de igualdade.


Outro aspecto é o nítido preconceito que sofrem,  preconceito latente por sua condição social e também pela distinção de raça, apenas recentemente quando este grupo conseguiu a distinção de Quilombo é que este fato começou a mudar. Mas apenas no discurso, na prática ainda impera o estereótipo cultural.


Agradeço a todos os moradores do Quilombo Brotas, que permitiram a realização deste trabalho dentro da comunidade. Sempre muito receptivos, eles me ajudaram a compreender um pouco mais da história daquele lugar e fizeram que aumentasse o meu respeito pela comunidade.

Agradeço a professora Aparecida das Graças Geraldo, por organizar este trabalho de campo e conduzir o processo de conhecimento e aprendizado, com muita paciência, orientando-nos a cada passo dado na construção do raciocínio e ideias para se chegar à conclusão deste relatório.
 
Aos meus companheiros de viagem, pares licenciandos que apoiaram a atividade.

 

domingo, 9 de setembro de 2012

"O ENCOURAÇADO POTTEMKIN" ANÁLISE DO FILME

Ficha técnica:
Diretor: Sergei Eisenstein
Fotografia: Eduard Tisse
Música: Edmund Meisel (composta para performance ao vivo)
Ano da produção: 1925
Duração: 75’

Análise
Em 1926 a Academia Americana de Artes o elegeu o "melhor filme do mundo" e em 1958 a Exposição Internacional de Bruxelas considerou-o "melhor filme de todos os tempos e de todos os povos".
O filme conta a história do maior navio de guerra da armada imperial russa, o Couraçado Potemkin, no ano da primeira revolução socialista soviética. Essa obra explora os recursos técnicos da linguagem cinematográfica de forma a fugir das abordagens "dramatúrgicas", tão comuns no primeiro cinema de arte europeu. São assim valorizados os elementos de montagem, dos planos e tomadas e do enredo permeado por numerosos elementos simbólicos.
Numa espécie de representação holonômica, Eisenstein procura mostrar microcosmicamente como se inicia e desenrola a revolução socialista. Parece defender a tese de que não é necessária uma ampla consciência de classe para detonar um movimento revolucionário. Basta que, a partir de um fato isolado, se desencadeie uma série de ações que coloquem em movimento um número cada vez maior de envolvidos, potencializando as forças coletivas progressivamente. É exatamente isso que acontece na segunda parte, uma das mais alegóricas de todo o filme. As referências à estratificação social russa e a utilização de diversos signos simbólicos faz com que se reproduza em torno e dentro do Couraçado todo o movimento social do país.
O filme está dividido em cinco partes, dispostas na versão original da seguinte forma:
I
II
III
IV
V
14 min
19 min
11 min
11 min
20 min
Parece haver uma busca de equilíbrio e contraste nesta distribuição: após a introdução, espécie de apresentação temática e espaço-temporal, a parte II sintetiza o processo revolucionário soviético num ritmo muito dinâmico, a parte III contrasta com a antecedente e precedente num pesado clima depressivo, e as duas partes finais retomam, através de um crescendo, o ritmo composto de tensão e movimento. A aparentemente excessiva simetria na distribuição temporal das partes pode ser visualizada, então, da seguinte forma (proporção melhor visualizada com o browser bem largo):
INTRO
II
III
IV e V
14 min
19 min
11 min
31 min
Um fato notável sobre as primeiras exibições do filme fora da Rússia se deu na Suécia, onde foi realizado um procedimento interessante de censura: ao invés de cortar cenas, foi alterada a ordem das partes do filme de forma a induzir o público a crer que o levante revolucionário dos marujos do Potemkin termina com o seu fuzilamento, o que se fez através da transposição dessa cena para o final do filme (1).
Num artigo intitulado Cinema e Literatura: A Estrutura do Enredo, Umberto Eco (2) utiliza o filme e esta montagem censora como exemplos da importância da temporalidade na arte cinematográfica.

Partes
I - Introdução (0-14=14’)
    • Situa o tempo, através de um diálogo entre os marujos Vakulintchuk e Matiuchenko, no início do levante operário da Revolução Russa de 1905.
    • O espaço é o do Couraçado Potemkin na Baía do Tendra (Mar Negro), próximo à cidade de Odessa.
    • A crise do país é micro-representada na carne com vermes que será servida aos marinheiros do Couraçado, avaliada como boa pelo oficial médico Smirnov.
    • Os marinheiros, revoltados com a situação, recusam-se a comer a sopa e furtam os enlatados reservados aos oficiais.
II - O Drama na Baía do Tendra (14-33=19’)
    • Todos chamados ao convés, constrói-se no navio metaforicamente a estratificação social russa: o almirante Guiliarovsky (o Czar Nicolau II), oficiais do primeiro escalão (a aristocracia), a guarda (o exército imperial), os "dragões" do segundo escalão (a burguesia) e os marinheiros não graduados (o proletariado).
    • Questionados pelo almirante sobre a boa qualidade sopa, começam a aderir os oficiais e a maioria dos marujos. A aceitação da carne podre representa a aceitação do "regime" do Czar. A frase "A maioria aderiu" simboliza os menscheviques do Partido Social Democrata russo.
    • Ao final da "adesão" a minoria (bolchevique) é encurralada num canto da proa, simbolizando sua posição de vanguarda, dos que vão "à frente".
    • Ao perceber o risco que correm, alguns marujos tentam fugir pela escotilha do almirante mas são violentamente impedidos pelo próprio almirante, simbolizando a inacessibilidade do povo aos privilégios da elite.
    • Essa vanguarda é coberta com uma lona para ser executada. Aparece (nas alturas do convés) o pastor (figura estranhíssima, quase demoníaca, de olhar obsessivo) que afirma "Senhor, fazei-os voltar à obediência", mostrando o apoio da Igreja ao status quo. Um close passeia por vários elementos repertoriais metálicos: mostra uma cruz na mão do pastor (símbolo do poder eclesiástico), passa para a espada (arma branca) de um oficial (poder imperial), para as armas de fogo (arma negra) da guarda (poder militar) e em seguida para a corneta (voz metálica).
    • A voz afirmativa do poder (na frase do oficial "Fogo!") vai ser oposta pela voz questionadora do proletário Vakulintchuk (na frase "Irmãos! Contra quem vão atirar?"). É um momento de enorme tensão, representando o prenúncio de um salto qualitativo de consciência. Ao início do levante, Vakulintchuk sobe em uma plataforma para incitar os irmãos à luta.
    • Os "dragões" são atacados, mas o almirante escapa (assim como o Czar escapou durante algum tempo).
    • Numa cena onde são distribuídas as armas, aparecem nitidamente os "pés-descalços" de um marujo, reforçando a figura e situação do proletário.
    • Na iminência de ser atacado, o pastor empunha a cruz em defesa própria, utilizando o nome de Deus para tentar se salvar ("Deus te castiga!"). Ao ser atacado, derruba a cruz que se finca no convés de madeira, mostrando seu poder cortante. Aparece a seguir o pastor desfalecido numa escada. 
    • Várias lutas são facilmente vencidas pelos marujos, bem mais numerosos. Como um efeito em cadeia, parece que todos vão progressivamente tomando consciência de sua força coletiva.
    • Um marinheiro bate com o cabo da arma nos pés de um oficial que cai ao mar, mostrando que a burguesia deve ser atingida nas suas bases (a propriedade, o capital, o poder econômico) para ser derrotada.
    • O pastor aparentemente morto abre dissimuladamente um dos olhos, simbolizando a falsidade da religião, "ópio do povo" nas palavras de Marx e Engels.
    • Vários "dragões" são atirados ao mar e reaparece a cena dos vermes na carne, simbolizando o estado parasitário da burguesia no "tecido" social.
    • A última imagem antes do grito de vitória é dos óculos de Smirnov, uma referência à visão (?).
    • O almirante persegue e mata Vakulintchuk com um tiro pelas costas, representando a perseguição e risco das lideranças populares.
    • A parte II se encerra com a cena de vários marujos jogando-se ao mar para tentar salvar Vakulintchuk, mostrando a camaradagem como valor revolucionário.
III - O Morto Conclama (33-44=11’)
Parte mais pesarosa e reflexiva do filme. Expõe o percurso desde o velamento do mártir, onde a população de Odessa chora a morte do herói, até a revolta das massas ocorrida a partir da provocação de um burguês anti-semita. Nesta parte é dita a frase "Um por todos e todos por um", um dos principais leit-motiv do filme.
    • Vela - símbolo da iluminação, fonte da consciência e da vigília.
    • Pescadores - proletário é o real produtor de bens indispensáveis.
    • Escadaria - símbolo da estratificação social e das divisões hierárquicas.
    • Procissão - representando a necessidade da movimentação social, coletiva.
    • Moedas doadas - solidariedade como valor.
    • Leitura do manifesto - tomada de consciência. É o morto que conclama o povo à revolta.
IV - A Escadaria de Odessa (44-55=11’)
Aqui se desenrola o massacre do povo de Odessa pela guarda imperial do Czar. Cenas de alta dramaticidade reproduzem a verve assassina e cruel do exército frente a mulheres, crianças e homens desarmados. É nesta parte que ocorre uma cena que ficou para a história do cinema, citada por vários diretores: a do carrinho de bebê que rola escada abaixo após a morte da mãe.
    • Dezenas de veleiros vão cumprimentar os revoltosos do Potemkin.
    • Água (purificação) reflete a luz do sol (iluminação) numa cena de rara beleza.
    • Povo de Odessa doa alimentos aos marujos (solidariedade).
    • Clima positivo é representado por sorrisos, pela música e por crianças felizes.
    • Guarda-sol avança até cobrir o campo de visão. Rompe-se o clima inicial desta parte. Surge uma estátua (do Czar, talvez) e inicia-se o massacre do povo pelos Cossacos do exército imperial.
    • Uma criança é atingida, desfalece e é pisoteada. A câmera dá um close na pisada que um homem dá em sua mão. Sua mãe enlouquece. Toma o filho no colo para denunciar a insanidade do massacre. Anda contra a corrente da multidão que foge e é impiedosamente morta pelo exército. Ênfase na crueldade. A referência à figura da mãe pode simbolizar o desprezo à fraternidade e a incapacidade dos homens do exército em reconhecer sua igualdade de origem com o povo de Odessa.
    • Outra mãe, com um carrinho de bebê na escadaria, é assassinada. Após close na fivela de seu cinto, ela é mostrada caindo e empurrando acidentalmente o carrinho escada abaixo.
    • Uma face de mulher, mostrada anteriormente rindo, aparece agora chorando e se desesperando com o rolar do carrinho pela escadaria. Num corte brusco, surge o couraçado que responde ao ataque destruindo o Teatro de Odessa, sugerindo que a violência é gerada pela violência.
V - O Encontro com a Esquadra (55-1:15=20’)
    • Uma assembléia dos marujos discute sobre o seu desembarque para auxiliar o povo de Odessa. A notícia de que a esquadra imperial está a caminho faz com que decidam se preparar para enfrentá-la. Ela representa a figura do Czar que deve ser derrotado.
    • A espera pela chegada da esquadra mescla, paradoxalmente, um clima de tensão e de estaticidade.
    • Desce uma bandeira entre dois canhões.
    • Aparecem instrumentos de medida, uma referência ao desmesuramento do regime imperial.
    • O leme, indicativo de direção, é mostrado diversas vezes, agora nas mãos dos marujos.
    • Binóculo - visão.
    • Ex-dragão tira o casaco de oficial e se veste como marujo. Todos agora estão no mesmo nível.
    • Corneta - ?. Cachimbo - ?.
    • O clima se torna altamente dinâmico, com a preparação do couraçado para o combate. Todos correm e a música acelera o ritmo.
    • A ordem "máquinas a todo vapor" é seguida por imagens de pistões (máquinas) e da chaminé expelindo fumaça (vapor). Esse ciclo é repetido, aumentando a tensão.
    • A frase "um por todos e todos por um" da parte III se torna nesse instante "um contra todos e todos contra um".
    • Como última tentativa, o Potemkin manda uma mensagem para a esquadra incitando os outros barcos a aderirem à Revolução, o que efetivamente ocorre, encerrando o filme numa espécie de "anti-clímax" pacífico representado pelo "hurra" geral e o hasteamento da bandeira vermelha do socialismo.

Conclusão
É admirável a profusão de símbolos nesta obra do início do século. A multiplicidade atual dos recursos técnicos parece, ao contrário de enriquecer tais possibilidades, ter tentado substituir o papel da dimensão simbólica na arte cinematográfica.
Tomemos como exemplo diferencial o desfecho do filme. A própria idéia de "anti-clímax" é proveniente de nossa expectativa de um combate final. O término do filme com uma comemoração de fraternidade, talvez hoje considerado piegas por muitos, na verdade consolida um clímax imprevisto.
A forma como Eisenstein trata a violência, como uma espécie de aberração, difere bastante da produção hollywoodiana que a coloca como característica natural de "homens violentos" (sejam eles heróis ou anti-heróis). Ao invés de objetivar "entreter" com a violência, visa fazer-nos pensar sobre ela, recusá-la socialmente.
Os heróis do Potemkin, ainda que referenciados individualmente, apontam sempre para o coletivo. Vakulintchuk e Matiuchenko aparecem sempre ligados aos "irmãos" ou "camaradas". Contradizem diametralmente os heróis "personalizados" a que estamos habituados na cultura ocidental. São homens muito mais próximos de nós que os mitológicos Batman ou Superman.
Mais do que uma apologia ao socialismo, o "Couraçado" intenta simbolizar um processo qualitativo de transformação. Opondo-se ao cinema "teatral" de catarse, que até hoje encontra amplos espaços no cinema de entretenimento, abre espaço para uma conjunção paradoxal do narrativo-descritivo com o sugestivo-simbólico. Além de um filme histórico – tanto no sentido de descrever fatos da história soviética quanto no de ter se tornado uma obra histórica para o cinema – o "Potemkin" pode ser entendido como um libelo à paz e em defesa da liberdade, seja da expressão artística, seja da própria condição humana.

Notas
(1) Jan MUKARÓVSKÝ, Em Volta da Estética do Cinema, in Escritos sobre Estética e Semiótica da Arte, Lisboa, Estampa, 1981, p. 206. (volta ao ponto da nota)
(2) Umberto ECO, A Definição da Arte, Lisboa, Presença, 1972. (volta ao ponto da nota)

A TRADIÇÃO ORAL – REVENDO ALGUMAS QUESTÕES

Começamos pela importância da tradição oral indígena para documentar tempos históricos onde não existem documentos escritos, pelo menos da parte dos indígenas.

Cada vez mais tem sido exigido pelos povos indígenas ser reavaliados a história das relações entre nativos e brancos, pois na sua visão está incorreto suas imagens e suas representações serem guiados pelo outro lado.

Os povos indígenas acreditam que a repetição oral de suas histórias será mais bem entendida, diferente do meio acadêmico que escrutinam suas fontes. O desafio está em conciliar os dois lados.


Abordagens históricas à análise da tradição oral.

Tradição oral – Bens materiais que ficaram do passado, ou outro vezes, o nome do processo pelo qual a informação é levada de geração a geração.
História oral – Método de pesquisa baseado em entrevistas de uma testemunha ocular do fato histórico.

Algumas abordagens:
1)    No século XIX, os folcloristas europeus consideravam os relatos orais como coisas isoladas para colecionar.
2)    Nessa formula surge com grupos de interesse que se apropriam de tradições indígenas, dizendo encontrar nelas espiritualidade ou conhecimento natural da ecologia.


Nas duas abordagens espera-se que os problemas do estado moderno recebem respostas convenientes para os estados modernos vindos dos indígenas.

Apesar de alguns acadêmicos do século XIX se preocupar com o contexto social em que a tradição oral ocorre, contudo, interessavam pelo discurso do presente mais do que passado.

Em meados do século XX, os estruturalistas influenciados por Claude Lévi-Strauss que a tradição oral é expressões da mente humana, nada tem a ver com presente ou passado.

São simbolicamente narrativas que atuam para tentar resolverem questões do comportamento social que não podem ser resolvidas por causa de sua complexidade, isto é, não tem nada de real, pois a realidade está em nível mais profundo.


Outra estrutura deste século XX vincula a tradição oral aos movimentos políticos que usaram como interesse para acender o nacionalismo. Buscando reconstituir herança cultural perdida para unir a população por causa de suas origens. É usada como exemplo a Alemanha que esse nacionalismo floresceu unindo estados dispersos, e a China que no momento oportuno legitimou rebeliões contra o Império e depois foi sufocada pelo novo estado que fora criado.

Abordagens atuais á análise da tradição oral.
Atualmente a tradição oral é estudada sua formação como seu posicionamento, e pode ser vista como transmissões de conhecimentos. Não se pode comparar com a pesquisa acadêmica, pois diante de uma evidencia legitima pode possuir significados diferentes.

A história oral sobre o passado que já foi considerada limitada pelo seu caráter subjetivo, hoje se tornou uma virtude para entender os processos históricos através da vida de uma pessoa.

Neste entendimento temos duas abordagens:
1)    Um focaliza a história social, a vida cotidiana e as contradições das relações de poder.
2)    A outra se preocupa com a formação das narrativas e os seus meios usados para firmar seu discurso.

Vamos para alguns exemplos de observações em quatro contextos culturais:
1) Renato Rosaldo começou seu trabalho na Filipinas nos anos 70, pensando reconstruir a história desse povo usando fontes orais. Mas uma de suas contribuições foi demonstrar que pode ser prejudicada nossa capacidade de escutar o que está sendo dito. Segundo ele é um erro equiparar os depoimentos orais com documentos escritos, pois os depoimentos orais devem ser ouvidos no seu contexto. A advertência de Rosaldo é para que se estude o texto e não olhe através dele, em torno dele ou por trás dele.

2) Na Nova Zelândia, a historiadora Judith Binney resolveu comparar história dos maoris com os textos escritos dos pakehas, e sua maior conclusão que não há como acabar com as contradições entre história oral e escrita.

3) Trabalhando na África Oriental, David Cohen, verificou que deve haver um cuidado para não afirmar uma história oral, porque é inevitável o privilégio de classes ou clãs mais fortes, ou cujas tradições se assemelham mais as nossas. Fala também da memória que para alguns é mais escassa.

4) No fim dos anos 80 os chefes de algumas tribos decidiram defender seus direitos de terras na Suprema Corte de um mundo codificado com suas tradições orais. O juiz canadense negou valor da história oral como evidencia e se prendeu ao que havia de escrito para sua sentença.
O ponto em comum dos quatro exemplos é que em lugares diferentes a história oral tem peso diferente para suas sociedades.


Também devemos ser criteriosos sobre as tentativas de codificar essa história oral.

Instrução etnográfica: para onde nos conduz?
A tradição oral complica nossas perguntas quando olhamos para o discurso acadêmico, como ocidentais ficam perdidos diante de diferentes de tipos de evidencias para recriarmos o passado.

Quanto às questões indígenas ficarão as perguntas de quem faz a história legitima? Quem identifica os eventos que são importantes historicamente?
Há duas correntes que estudam a reconstrução da história indígena:
1) O estudo de sociedades autônomas de pequena escala é um erro porque está contraria ao sistema mundial em quais todas as economias estão inseridas.
2) A postura cultural construcionista oposta sugere que a cultura está sempre em processo por decorrência das condições externas.

A conclusão vem do antropólogo Richard Lee que fala que um faz isso negando a existência das sociedades autônomas de pequena escala e o outro diz que suas histórias foram inventadas.

Resenha de parte do livro "Uso e Abuso da História Oral" de Janaina Amado